Azeda o clima entre as estatais e as operadoras de Telecom
:: Luís Osvaldo Grossmann
:: Convergência Digital:: 30/07/2009
Entre as idas e vindas do projeto de reativação da Telebrás, um ponto parece evidente: uma rede de dados própria do governo tem forte apoio das estatais responsáveis por TI e processamento. Quem duvida pode folhear as 60 páginas do Caderno de Debates, distribuídas pela Dataprev, com o conteúdo do 1º Fórum de Tecnologia, Informação e Comunicação, promovido pela empresa e realizado no início do ano com diversos gestores de TIC.
A análise parte das "falhas de grande vulto nas redes das operadoras", passa pela dificuldade dos órgãos públicos e garantirem bons Acordos de Nível de Serviço (SLA, na sigla em inglês), pelas opções existentes de contingência de rede e chega na competitividade - ou na falta dela - no mercado de telecomunicações. Para concluir, o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna, trata da cooperação dentro do setor estatal.
Para os que se queixam da falta de transparência do plano de se estabelecer uma rede pública - com razão, uma vez que o governo vem fugindo dos debates sobre o tema - o caderno do 1º Fórum de TIC é um prato cheio. Da sua leitura é possível extrair o porquê de o governo se sentir refém das operadoras privadas e, principalmente, como poderia vir a ser utilizada uma estrutura estatal (seja ela via Telebrás ou por outra solução).
"Mais de 50% dos problemas que temos estão relacionados à rede da operadora, especificamente ao backbone da operadora, e não à rede de acesso", dispara o gerente do Departamento de Redes de Telecomunicações da Dataprev, Luis Antonio Najan, ao listar uma série de panes que deixou parados em falhas de uma a até 60 horas, o atendimento nas agências da Previdência Social.
"O serviço que as operadoras oferecem é precário. Até hoje, não fui informado sobre quais foram as causas dessas interrupções. As operadoras dão explicações que não nos convencem". Segundo ele, o Ministério da Previdência chegou a prever o cancelamento dos contratos. Porém, completa Najan, "devido à restrita quantidade de prestadores desse tipo de serviço, o cancelamento não foi efetivado".
Para ele, a exemplo do que disse na terça-feira, 28/07, o ministro da Justiça, Tarso Genro, as operadoras não se preocupam com multas. "Elas têm seguro contra multas, então, há um descaso muito grande. A multa para elas não faz diferença, mesmo que seja aplicada todos os dias".
Na prática, a Dataprev está à frente de um dilema: como prover telecomunicações para garantir a implantação de novas 750 agências da Previdência Social -hoje são 1,2 mil. "É uma expansão gigantesca que implica em rede. São agências em cidades de 20 mil habitantes, onde a infraestrutura, sobretudo de backhaul, não está a contento", diz o presidente da empresa, Rodrigo Assumpção.
"Tenho a impressão que as operadoras subestimaram enormemente o crescimento do país e a velocidade dos investimentos. Não investiram e acharam que o mercado terceirizado iria prover os técnicos necessários. Houve um subplanejamento dos processos", acredita ele, que completa. "Não se será via Telebrás, mas certamente o governo precisa de uma infraestrutura própria para prover esses serviços. E a Dataprev aguarda ansiosamente uma solução de governo".
A julgar pelo conteúdo do 1º Fórum de TIC, a Dataprev não é a única nessa espera. Além de reclamar das falhas de rede, representantes do Banco do Brasil, do Serpro e da Rede Nacional de Pesquisa lembram, ainda, as dificuldades em estabelecer opções efetivas de contingência - a exemplos de contratos que exigem dupla entrada de fibra ótica, mas em que a duplicidade se perde porque ambos os cabos são ligados num único equipamento. E mesmo a contratação de operadoras distintas não garante a contingência, uma vez que, em muitos casos, elas compartilham recursos, principalmente fibras e dutos.
Além disso, os gestores de TI apontam que num determinado local, qualquer que seja, em geral aparecem apenas dois concorrentes em licitações - normalmente a concessionária da região e a nacional.
Segundo o secretário de Logística e TI do Planejamento, Rogério Santanna, a menção sobre uma eventual retomada da Telebrás já provocou reações no mercado. "Uma matéria publicada no jornal sobre a possibilidade de a Telebrás ressurgir levou as operadoras a refletirem sobre alguns assuntos. Um deles foi a negociação que estávamos fazendo de levar banda larga às escolas, com as operadoras querendo instalar insuficientes 10 mil pontos – são 16 mil escolas só de ensino médio. As operadoras reclamaram muito, mas vão ligar tudo”.
Santanna explica que há várias opções para operar o backbone do que chama de infovia nacional, como a Telebrás, a Dataprev ou o Serpro. Ele também lembra das redes de distribuição de energia elétrica e seus cabos ópticos OPGW (cabos pára-raio). Além disso, aponta que nas regiões de maior demanda, há praticamente sobreposição entre as redes das diversas companhias elétricas e as dos gasodutos da Petrobras.
"Em São Paulo e Rio de Janeiro, pode-se iniciar uma infovia utilizando a estrutura dessas empresas públicas, que já pagaram tudo, e compartilhar esse backbone com estados, municípios, ONGs, pequenos provedores, de modo a se constituir uma rede com grande capilaridade", sustenta, em sua apresentação no Fórum, Rogério Santanna.
A conclusão do secretário também é esclarecedora. “Os gastos somados de todas as instituições participantes deste fórum, sem juntar os do Banco do Brasil, da Caixa e da ECT, já sustentam esse backbone e paga o funcionamento da empresa pública como um todo em relação a esse assunto. Não falo em concorrer com a iniciativa privada, apenas de atender ao grande cliente que é o governo brasileiro, com uma infraestrutura independente, capaz de ligar todas as agências da Previdência, os postos da Receita, os pontos do IBGE, as delegacias de polícia, as secretarias de Segurança Pública, as escolas, os postos de saúde e os hospitais”.
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