Inclusão digital para a inclusão social – política pública é responsabilidade do Estado, sustentabilidade é regra de mercado.
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Por: Jesulino Alves de Souza
Ativista da inclusão digital e Software Livre
mslguarulhos@gmail.com
telecentrosbr@gmail.com


Em 2001, quando começamos a atuar como monitores nos telecentros da prefeitura de São Paulo,  na periferia, não por acaso o principal critério adotado para definir os bairros que receberiam as unidades foi o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Hoje, cada vez mais se comprova que a as ferramentas da tecnologia da informação e da comunicação (TICs) são importantes instrumentos para romper o isolamento e o atraso dos pobres -- desde que as políticas de inclusão sejam mediadas e articuladas intensamente com participação da população e acompanhamento dos gestores.

Já há dez anos, em nosso trabalho diário, procurávamos, além da alfabetização digital, levar à população um atendimento digno, inclusivo, respeitoso. Em situações de exclusão e conflito social, atuávamos como orientadores, ouvíamos e éramos ouvidos. A partir daí, apresentavam-se as condições de uma verdadeira parceria, em que as ferramentas tecnológicas não eram um fim, e sim um meio de suprir as carências sócio-econômicas, coletivas e individuais, daquelas populações. Muitos eram jovens e adultos que não podiam procurar emprego porque não tinham dinheiro para o transporte. No telecentro, com nossa ajuda, enviavam currículos pela rede, se sentiam incentivados a fazer um curso e descobrir as vantagens das ferramentas disponíveis. É a isso que chamamos de atendimento humano e inclusivo -- o primeiro motivo para o estabelecimento de um projeto público de inclusão digital.

Projetando esse cenário para o país, 50 milhões de brasileiros -- 19 milhões de famílias que recebem o Bolsa Família -- não têm renda suficiente para comprar um computador, muito menos para conectá-lo a internet. Além de tantos direitos fundamentais desses cidadãos, como o direito à saúde, à educação e ao transporte, estrategicamente há que se pensar no direito à comunicação como um direito fundamental. Pois comunicação é poder. E, na democracia, o povo precisa ter o poder para expressar suas ideias, opiniões e cobrar o dever do estado.

Não só o direito à comunicação, mas o desenvolvimento individual e coletivo, a inclusão social com capacitação e a educação para geração sustentável de renda, bem como a participação do estado na cidadania, passam necessariamente pelo acesso às TICs. O que nos dá mais um motivo para que o estado invista nas políticas públicas de inclusão digital. Para as famílias que dependem do bolsa família, ou, para muitas outras que nem foram ainda beneficiadas e vivem na linha da indigência, o acesso gratuito à internet é vital. Caso contrário, se excluirá ainda mais os já excluídos, em nome do empreendedorismo e às custas da competição corporativa. Para esses, gastar R$ 1 em uma lan house significa, muitas vezes, deixar de comprar o pão para a café da manhã ou outra necessidade básica. Por não ter R$ 1, acabam deixando de buscar, no computador, as oportunidades de aprendizagem e mudança que as conexões em rede oferecem.

Porém, as lan houses têm seu papel. Existe um grupo populacional que procura as lan houses e que lhes garante a sustentabilidade, gerando pequenos negócios e renda. Sem dúvida, esses equipamentos merecem incentivos de projetos de empreendedorismo e regularização, mas não devem substituir as redes públicas de telecentros.

Estatísticas, no que diz respeito a acessos de telecentros, não podem avaliar apenas quantitativamente, uma vez que o objetivo não é só saber quantos atendemos, mas quantos incluímos. A lan house surgiu para atender a uma demanda de mercado, e não com a missão de fazer inclusão digital, embora tenha incorporado essa função espontaneamente. Ainda assim, não podemos considerar acesso digital como inclusão digital. Um espaço de inclusão digital deve ir além de paredes, computadores, cadeiras e conexão à internet.

É preciso ir além de cursos e de navegação. É preciso estimular o protagonismo, ensinar as pessoas criar e produzir conteúdo local, a interagir com as redes da sociedade, a aprender a encontrar oportunidades, a exercer a cidadania e se preparar para um futuro possível.

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