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No último sábado foi anunciada oficialmente a aprovação da versão 1.2 do ODF (OpenDocument Format) pelo OASIS ODF TC, comitê internacional que desenvolve o padrão ODF. A próxima etapa é a aprovação da versão 1.2 pelo OASIS, votação que deverá ser iniciada nos próximos dias.

Pelos processos do OASIS, uma especificação primeiro deve ser aprovada pelo comitê que a produziu para que possa posteriormente ser votada por todo o OASIS. Além da especificação aprovada, é necessário ainda que se tenha ao menos 3 declarações de empresas de que o padrão está sendo utilizado por elas de forma interoperável. Até o presente momento, contamos com declarações da IBM, Oracle, KDE e Novell.

As principais novidades em relação a versões anteriores do padrão estão relacionadas ao suporte à assinaturas digitais, web semântica e finalmente um padrão para armazenamento de fórmulas em planilhas (OpenFormula).

Este anúncio marca o término do ciclo de desenvolvimento do ODF 1.2 pelo ODF TC, depois de 4 anos de trabalhos. Eu participei de 3 destes 4 anos e gostaria de compartilhar aqui com vocês algumas das lições que aprendi.

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A primeira delas, é que participar do desenvolvimento de uma especificação como o ODF, que será utilizada por milhões de pessoas em todo o mundo para o armazenamento de suas informações é algo extremamente gratificante, mas é também uma imensa responsabilidade.

Para mim o grande desafio colocado aos desenvolvedores é o balanceamento adequado entre a necessidade de especificar da melhor forma possível os elementos da norma, sem que isto impacte na capacidade de inovação da indústria.

Qualquer restrição adicional colocada na especificação pode ter como impacto uma restrição no momento da sua implementação, o que significa neste caso que restrições em excesso podem acabar engessando as possibilidades de utilização de documentos eletrônicos.

Por este motivo, muitas vezes somos obrigados a colocar uma recomendação onde o mais adequado poderia ser uma obrigação, e entender os impactos disso dá bastante trabalho e normalmente gera muita discussão dentro do comitê, e discutimos até que se tenha consenso sobre a decisão tomada. Por isso mesmo é importante que existam dentro dos comitês não apenas representantes de empresas de software, mas também representantes de usuários dos softwares, pois são estes os que sofrerão as consequências de um “deve” mal colocado.

O segundo grande desafio que enfrentei é a falta de suporte às minhas atividades de desenvolvimento da especificação. Acredito que parte disso seja culpa da minha teimosia por insistir em continuar um trabalho que infelizmente não é NADA valorizado em nosso país.

Podem entender isso como um desabafo pessoal, mas ‘tapinha nas costas’ não paga as contas e infelizmente as empresas brasileiras ainda não entenderam que para ter lugar no mercado global não basta ser um bom usuário de padrões, mas ser um bom desenvolvedor de padrões.

Como sou teimoso, passei por momentos extremamente complicados na minha vida pessoal (e financeira) durante os últimos anos e não foram poucas as vezes em que tive vontade de jogar a toalha e ser mais um sentado no sofá reclamando de como o império domina a colônia.

O que me motivou a continuar foi a receptividade e o respeito que sempre tive dentro do comitê do ODF, que me mostrou que de fato o Brasil e os profissionais brasileiros têm muitas portas abertas e oportunidades no mundo da tecnologia e o que falta mesmo é força de vontade para encarar o desafio e seguir em frente. Não existe empresa no mundo que invista de verdade aqui sem que sejamos capazes de mostrar a eles que temos competência e que podemos de verdade participar do desenvolvimento de tecnologia. Fiz a minha parte e posso dizer que a sensação de dever comprido paga tudo.

Gostaria ainda de lembrar-lhes que por mais que tenhamos feito muito e avançado com a TI em nosso país, com raríssimas exceções, ainda somos uma nação de usuários e não importa aqui se o produto em questão é livre ou proprietário… nossa posição cômoda de usar e reclamar é que nos faz ficar estagnados onde estamos (e sim, estamos estagnados) e mudar este quadro não depende apenas de política, interesse comercial e financiamento. Depende de atitude de pessoas como você e eu, e se você quer mesmo mudar isso: mexa-se !

Pretendo continuar trabalhando no comitê do ODF, e pretendo também continuar o trabalho dentro da ISO, onde participo do grupo de trabalho que trata da adoção do ODF na ISO (depois de aprovado pelo OASIS, o ODF 1.2 deverá ser enviado à ISO). A teimosia é forte por aqui, e gostaria de ver mais teimosos ao meu lado neste trabalho.

Entendo também que a conclusão do ODF 1.2 pelo OASIS encerra um ciclo profissional em minha carreira e em minha vida pessoal e por isso mesmo eu gostaria de agradecer a todos aqueles que me ajudaram nestes anos de batalha. Agradeço por tudo, principalmente pelos ‘tapinhas nas costas’ que inúmeras vezes foram responsáveis por me fazer seguir em frente :)

Gostaria de deixar um agradecimento especial àqueles que me deram a oportunidade de trabalhar com o ODF ainda lá em 2007, e outro aos que têm me apoiado durante os últimos doze meses. Vocês sabem quem são e agradeço de verdade por tudo o que fizeram e por tudo o que tentaram fazer por mim.

Não posso deixar de agradecer aqui também a um grupo especial de brasileiros teimosos que insistem como eu em continuar trabalhando no SC34 da ISO. Só nós sabemos o que passamos e quanto nos custou o trabalho que fizemos até hoje. Com vocês ao meu lado, qualquer batalha é “vencível”.

Para finalizar, gostaria de deixar aqui a frase que tem me motivado a seguir em frente quando as coisas ficam ruins de verdade:

“Seja a mudança que você quer ver no mundo.” Gandhi

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* fonte: blog de Jomar Silva