Suggest an articleLinux Magazine entrevista Marcos Mazoni, presidente do Serpro January 3, 2011, by Vitorio Furusho - No comments yetViewed 68 timesO Serpro é um dos principais fornecedores de soluções de tecnologia da informação para o governo federal e seus órgãos e empresas. Marcos Mazoni, presidente do órgão e do Comitê de Implantação de Software Livre do governo federal, conversou com a Linux Magazine a respeito de seu primeiro ano à frente da instituição, os desafios enfrentados e o que podemos esperar do próximo ano.
Linux Magazine» No final de 2007, você previu uma economia de R$100 milhões em 2008 com a substituição de software proprietário por Software Livre no governo federal. Isso se concretizou?
Marcos Mazoni» Tivemos muitas substituições de software proprietário por Software Livre. Porém, o governo federal possui sistemas de informação construídos nos últimos 40 anos que ainda estão em operação. Por isso, as substituições ocorreram em grau muito maior em nossa infra-estrutura do que propriamente nos novos sistemas.
A adoção de Software Livre em nossas ferramentas de desenvolvimento e nossa infra-estrutura de rede, além da nossa gestão da infra-estrutura, promoveram uma economia talvez até maior do que R$ 100 milhões.
Diversos componentes de Software Livre, como nosso framework de desenvolvimento e nossa ferramenta de correio, agenda e catálogo (Expresso), entraram em importantes empresas, como Dataprev, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Petrobras, o que deu uma economia muito grande a todas as empresas do governo e, portanto, também para o orçamento.
LM» No momento, quais são os maiores clientes do Serpro?
MM» A Receita Federal corresponde a 70% da nossa atividade, enquanto o Ministério da Fazenda responde por 80%, ao Ministério do Planejamento cabem 10% e outros 30 órgãos compõem os 10% restantes do nosso trabalho.
Na prática, somos praticamente um órgão interno do Ministério da Fazenda.
LM» Como anda a migração do governo federal para o BrOffice.org?
MM» Após a adesão ao protocolo que orienta a utilização do ODF, estamos com todos os órgãos em processo de migração ou em planejamento com o PDTI para 2009. Isso inclui grandes estruturas, como o Exército, a Aeronáutica, Banco do Brasil, Caixa Econômica e outras.
LM» O episódio da aprovação na ISO do padrão concorrente do ODF, o OOXML, teve alguma repercussão negativa sobre os trabalhos de adoção do ODF no governo?
MM» Não, pois isso teve pouca influência sobre a adesão ao protocolo. Com os órgãos aderindo ao protocolo, eles fazem a opção natural pelo BrOffice.org.
LM» Você afirmou recentemente que em 2009 o Serpro iria promover treinamentos em ferramentas livres no governo, e que para isso seriam necessárias redes. Quais dessas redes já existem?
MM» Algumas já existem. Por exemplo, no BrOffice.org nós trabalhamos muito com o BrOffice Brasil. Outras estão em construção: estamos atuando nesse momento em parceria com cinco universidades federais com foco em ferramentas específicas. Com a Universidade Federal do Paraná estamos montando todo um processo de suporte e treinamento para bancos de dados livres; com a Universidade Federal de Pernambuco estamos trabalhando com ferramentas de reutilização de código e maturidade (desde análise de requisitos até a reutilização propriamente dita); estamos também trabalhando com mineração de dados com a Universidade Federal de Minas Gerais (Tamanduá); na Universidade Federal do Rio de Janeiro estamos trabalhando com a modelagem de dados. Estamos ampliando nossa rede para obtermos mais conhecimentos no mundo do Software Livre, pois o suporte depende cada vez mais de nós.
LM» Existe também interação com empresas privadas?
MM» Em dezembro, num evento no Rio de Janeiro, vamos colocar nossas ferramentas de desenvolvimento à disposição de comunidades externas. Nosso framework de geração de código Java, por exemplo, chamado 14 bis e derivado do Pinhão da Celepar. O nome é uma homenagem a Santos Dumont, cuja obra (o Demoiselle) foi disponibilizada em 1909 para quem desejasse alterar e utilizar para qualquer outro fim.
Vamos fazer o mesmo com nossa ferramenta de gestão de projetos, o E-Car, que hoje tem comunidades de governo e será aberta também a empresas privadas. A idéia é que o governo federal tenha mais ferramentas de TI para controle de custos e processos principalmente com a crise financeira mundial que terá conseqüências importantes no próximo ano.
Nossa lógica não é sempre termos que gerar o código, mas gerar renda dentro do país.
LM» Quais foram as maiores conquistas e dificuldades do Serpro e do Comitê de Implantação de Software Livre ao longo de 2008?
MM» No caso do Serpro, foi a opção que tínhamos de não trabalhar com software básico. Fomos obrigados a reverter essa opção, pois não tínhamos na empresa pessoas especialistas em sistemas operacionais, bancos de dados etc. O maior desafio, então, foi desenvolver a capacidade para que nossos funcionários voltassem a trabalhar com software básico. Descobrir aqueles que se encontravam em outros projetos para trazê-los ao desenvolvimento de software básico foi um desafio. Por último, construir essas ferramentas também foi difícil, mas conseguimos fazê-lo em um ano.
Entre as conquistas, a nova ferramenta de declaração do imposto de renda usada em 2008 foi marcante, assim como a criação de um modelo de governança dos softwares que desenvolvemos junto a órgãos públicos de outras esferas. Tudo isso foi feito sem qualquer prejuízo ao processo que já estava em andamento.
LM» Em relação à ferramenta de declaração do imposto de renda, existe alguma previsão para transformá-lo em Software Livre?
MM» Como ele é uma mistura de diversas ferramentas, há a questão legal dos códigos. Tão logo isso esteja resolvido, não há dificuldades para disponibilizá-lo.
LM» Após o intenso planejamento em 2008, quais dificuldades você prevê nas ações do próximo ano?
MM» Prevejo as dificuldades naturais a uma mudança de cultura. Na realidade, eu assumo parte da culpa, pois sempre mostramos bastante a questão da economia, debatemos muito sobre a questão da qualidade técnica dos produtos, mas acho que a principal chave foi pouco abordada: é a mudança de postura, de produtos adquiridos (software proprietário) para algo que vamos compartilhar e construir juntos (Software Livre).
Nesse sentido, mesmo dentro do universo do Software Livre, é muito comum nos vermos em comparações que pertencem, na realidade, ao modelo de software proprietário, como afirmar que um software “não faz algo”, em vez de “ainda não faz isso”. Por conta dessa postura, muitas vezes são iniciados projetos a partir do zero simplesmente porque não há alternativa livre que realize uma das funções desejadas para o software. Temos um exemplo disso, que foi o desenvolvimento de uma solução (Carteiro) de email, calendário, agenda e catálogo de endereços. Já existia o Expresso, que também era um software livre, e que realizava as mesmas tarefas.
Colaborar e participar de uma comunidade seria a melhor opção, pois teríamos uma evolução muito mais rápida e um salto de qualidade. Essa mudança de postura é o grande diferencial.
Santos Dumont, usando idéias de vários especialistas da sua época, precisou de apenas um ano para desenvolver o 14 bis, enquanto os irmãos Wright --- que não permitiram o uso de suas idéias --- levaram dez. Por isso, o brasileiro liberou também os conhecimentos sobre sua criação.
LM» Em caso de mudanças políticas na esfera federal, é possível que mude também a estratégia do governo para o Software Livre. Nesse caso, existem medidas no sentido de coibir um possível retorno ao favorecimento do software proprietário?
MM» Muitas pessoas falam isso, mas acho que nada na sociedade é “sem retorno”. Acredito que, se esse grupo político toma atitudes que beneficiam a sociedade, os outros grupos utilizarão essa estratégia tanto quanto nós --- mas talvez falando menos. Ninguém trocaria o Apache por uma ferramenta proprietária.
Não acredito que existam situações sem retorno.
LM» Uma das maiores carências do Software Livre no Brasil, hoje, é o ecossistema em torno das soluções. Porém, com órgãos públicos desenvolvendo softwares internamente, eles talvez não ajudem a solucionar isso. Como o Serpro pode promover melhorias nesse quadro?
MM» Acredito que a demanda atual por tecnologia é tão grande que nem todos os órgãos federais juntos conseguiriam supri-la. Então, teremos muitas contratações em 2009. Vamos nos integrar também à iniciativa privada através de uma maior abertura e facilitação do processo de contratação de serviços externos em Software Livre.
O que queremos evitar é a dependência de soluções. Acho que veremos importantes mudanças no ecossistema no próximo ano.
LM» Qual o impacto da crise financeira mundial sobre a indústria de software, especificamente sobre a indústria brasileira de Software Livre?
MM» Creio que teremos uma pressão de demanda, pois os gastos precisarão de mais controle --- refletindo-se em investimentos em tecnologia ---, a geração de receita terá de ser aumentada e os processos precisarão ser acelerados. Tudo isso deverá ser feito de forma equilibrada, ou seja, será necessário gastar menos com soluções que vão gerar mais renda.
Por isso, será importante para a nossa indústria local produzir Software Livre e ser referência nessa área.
* fonte: Linux Magazine
PSL-Brasil - Linux Magazine entrevista Marcos Mazoni, presidente do Serpro - Software Livre
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