A Comissão Europeia está entusiasmada com as capacidades da “economia digital” e acha que esse sector poderá mesmo ajudar o continente europeu a sair da crise. Num relatório publicado ontem, Viviane Reding, a comissária responsável pela sociedade da informação e dos media, salienta que a “economia digital europeia dispõe de um formidável potencial para gerar receitas avultadas em todos os sectores.”

Mas o que parece estar a estragar os seus planos é que os jovens europeus não se mostram lá muito inclinados a pagarem por conteúdos digitais e nem pretendem mudar de comportamento caso as alternativas grátis desapareçam de um momento para o outro. Isto é o que revela um estudo divulgado em paralelo por Bruxelas, segundo o qual um em cada três (33%) dos jovens inquiridos não querem pagar nem por downloads, nem pelo streaming de músicas ou vídeos. Mesmo assim, esta percentagem é o dobro da média registada em todos os Estados-membros.

O mais trágico para as perspectivas a longo prazo dos executivos da indústria de entretenimento é que 10 por cento dos inquiridos entre os 16 e os 24 anos admitiram não ter pago por conteúdos online durante os três meses que antecederam a realização do inquérito em que o estudo se baseia. Esta percentagem desce para cinco por cento no caso da média a nível dos 27 Estados-membro da União Europeia.

O mais digno de nota é que metade dos indivíduos que afirmaram não ter pago por conteúdos audiovisuais online disseram que absolutamente nada os faria mudar de ideias. Em relação à restante metade, 30 por cento disseram que estariam dispostos a pagar caso os preços fossem mais baixos. Melhor qualidade do que as versões grátis, maior opção de escolha e métodos de pagamento mais práticos seriam para os restantes 20 por cento razões suficiente para passarem a desembolsar dinheiro pelos conteúdos online.

Segundo os próprios autores do estudo, esta fraca inclinação por pagar pelos conteúdos online deve-se pura e simplesmente ao facto das pessoas já se terem habituado a encarar esses serviços como gratuitos ou associados à sua tarifa plana de banda larga.

Outra importante conclusão que esmaga por completo as ilusões das indústrias discográfica e cinematográfica de que bastaria apenas encerrar ou bloquear todos os sites e redes de partilha de ficheiros para convencer as pessoas a pagarem por aquilo que descarregam:

    A reduzida percentagem de indivíduos que consideram a possível ausência de conteúdos online livremente disponíveis como uma razão para pagar coloca em causa o argumento avançado por representantes da indústria de conteúdos de que os consumidores europeus irão a longo prazo padecer de uma escassez de lançamentos comerciais de conteúdos de elevada qualidade se o modelo actual de distribuição de conteúdos audiovisuais, baseado na cópia ilegal, não for travado.

Por outras palavras, mesmo se a RIAA, IFPI e MPAA conseguissem como que por artes mágicas fazer desaparecer da Internet todas as músicas e filmes disponíveis de borla, os utilizadores continuariam a não pagar.

Não se trata apenas, como a comissária Viviane Reding afirmou recentemente, do facto da pirataria se ter tornado algo sexy. As pessoas limitam-se a usufruir da abundância que a Rede de redes oferece. Mesmo que “as graves deficiências do sistema actual” – nomeadamente a inexistência de modelos de negócio alternativos e de soluções legais suficientemente atractivas – fossem de um momento para o outro resolvidas, não seria por isso que os internautas europeus iriam desatar a abrir os cordões à bolsa.

Por Miguel Caetano em Remixtures